" O que a Ana estava fazendo na rua naquele horário? Ela nunca sai à noite por medo de deixar as meninas sozinhas. E ela bateu o carro por minha cupa... Será que ela... Ah não, acho que não. Também, isso pouco me interessa, nem me interessa. Quero sumir daquela vida ridícula que levam naquela casa que um dia eu já morei. Como aguentei tanto tempo naquele lugar com aquela gente? Que mundo sem graça, monótono  Aqui sim, nas ruas, com meus amigos de verdade, isso sim que é bom, isso sim que é uma vida legal! Somos livres! Sem gente reclamando do que fazemos, sem ordens, sem regras, sem nenhuma menina chata como a Alice e sem pais ou irmãos me enchendo o saco. Mulheres, bebidas e drogas. Tudo pode. Tudo à vontade! Nem preciso ir pra escola e me preocupar com notas. É perfeito para qualquer um...Adeus mundo nojento dos certinhos, e que seja bem vindo esse mundo da liberdade. Liberdade que minha irmã dizia ser enganosa, mas não é, é a melhor coisa que existe e eu vou aproveitar até o fim da vida! Um mundo perigoso? Ana, minha irmã, isso é frescura sua, besteira, como tudo que você sempre me disse, uma mentira! Fique aí com suas outras irmãs certinhas, com a chata da Amanda e a problemática da Alice. Fique paradinha no lugar enquanto eu sigo em frente sendo guiado pela felicidade e pela liberdade. Suas tolas! Me fizeram de idiota, me deixaram de lado esses anos todos... Tudo sempre era Alice, Lili, Alice... Chega! Eu cansei de vocês! Amandinha querida, escute seu irmão. Somos gêmeos, dizem que gêmeos tem uma ligação, então me escute. Deixe esse mundo também e venha viver aqui. Assim como eu você é sempre segundo plano, parece que não percebe. Venha ser sempre você mesma, aqui tudo pode, tudo vale, tudo acontece da maneira que queremos. Adeus infelicidade, adeus dias ruins, adeus pra todos aqueles que nunca deram bola pra mim. Aqui eu sou eu, eu, eu. Só eu!"

-> " Diário Down" <- trecho

( Vivi Louhrinci)

Querido Papai Noel,

      Meu nome? Pra que você, um homem tão importante, iria querer saber quem sou eu? Se sou menina ou menino, isso também não importa agora. Sei que o Natal já passou, mas o Natal pra mim nunca existiu de verdade, nunca tive um Natal que eu pudesse chamar assim. Natal... O que é isso? Coisa de gente que pode comprar e que enche a casa de enfeites, comidas, presentes, só coisas que gente como eu nunca viu e nem sabe o que é. Está certo que as pessoas são mais caridosas com a gente nessa época, mas também, é só isso. Eu não quero que pense que estou reclamando da minha vida, muito pelo contrario eu agradeço a Deus por estar vivo ainda, pois já passei por dias sem comida e água, já passei por dias sem nem mesmo um papelão para me deitar, já perdi minha mãe, meu pai e alguns irmãos e amigos, e eu me mantenho firme e forte do jeito que der pra ser. Do melhor jeito possível. Eu não roubo, nunca roubei nada, não sou ladrão. Eu não peço dinheiro no sinaleiro como muita gente da rua como eu. Eu vivo da minha arte, da arte de saber fazer quadros com o que encontrar, a arte de escrever contos pros jornais, a arte de pintar paredes, não picha-lás, a artes e trabalhar com tudo que me aparece. Eu sou simples sim, mas como qualquer pessoa eu tenho vontades e desejos e mesmo sabendo que o Natal vai demorar pra chegar eu te faço um pedido, hoje.  Caro Noel, não quero que me ajude, não quero um brinquedo nem comida nem nada. Quero que ajude ao mundo e se fizer isso ajudará a mim também. Cuide de nós protegendo-nos de enchentes, tsunamis, deslisamentos de terra... Não quero ver mais gente na rua como eu, não quero que mais gente sofra assim, não quero mais gente morrendo, chorando, não quero ver gente triste e desesperada, quero ver gente feliz como nos filmes que de vez em quando eu vejo do lado de fora de uma casa com a janela aberta... Gente sem problemas grandes, gente sorrindo e andando tranquila nas ruas das cidades. Quero a paz. Quero ver esse planeta VIVER. Eu sei que é difícil, as pessoas destroem tudo aqui, mas talvez se tivesse uma chance de viverem contentes em suas casas com suas famílias,elas mudem suas cabeças e aprendam a cuidar do que o Senhor pode nos dar. Eu sei que você está me ouvindo e sei que vai ler esta carta assim como lê todas as outras, com amor, paciência e carinho. Não me importo se demorar até 25 de dezembro de 2013 para acontecer alguma coisa. Sabe Papai Noel, uma vez eu escutei uma música que dizia "...Fazer com que fosse Natal todo dia..." se meu pedido fosse atendido eu poderia dizer que o Natal existe e que ele não é apenas um dia, são todos os dias pra sempre.

Obrigada por me ouvir e por ler minha cartinha fora de época;
                                                                                             Um grande abraço


                                                                   ( Vivi Louhrinci )